segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Como mudar (I)

Chega o ano novo e maioria das pessoas fazem uma espécie de auto-exame, avaliam o ano que passou, recordam o que conseguiram alcançar e também o que deixaram por concretizar, renovam as resoluções e intenções para o ano que começa e ganham nova motivação e força de vontade. Constroem mentalmente a ideia de um novo recomeço, mas o que fazer para mantermos a motivação ao longo de todo o ano? Quantas vezes decidimos alcançar determinado objectivo, por exemplo, correr todos os dias antes do trabalho, ou mudarmos a nossa alimentação, ou reduzirmos o uso do carro e andarmos mais a pé, mas passado poucos dias, sem darmos por ela, lá estamos novamente a agir e reagir segundo padrões antigos. Porque é tão fácil para alguns cumprirem o que pretendem e porque é mais complicado para outros mudar?


Segundo a filosofia do Yoga, viemos ao mundo com uma herança de padrões mentais e emocionais, que em conjunto com as impressões que ficam alojadas no nosso "subconsciente pelas nossas experiências diárias, sejam conscientes ou inconscientes, internas ou externas, desejadas ou não" (Georg Feurstein (1)), vão influenciando e condicionando a nossa predisposição, os nossos hábitos, moldando a nossa forma de ser, pensar e agir, esta herança e impressões chamam -se de samskaras.


Agimos e reagimos continuamente segundo a sua influência e ora estamos a criar novos samskaras, ora a reforçar antigos samskaras. Os nossos pensamentos, palavras e acções deste momento foram desenhadas pelo nosso passado e os pensamentos, palavras e acções deste momento irão influenciar o nosso futuro. É uma roda cíclica, um contínuo de causa e efeito, que na maioria das vezes é difícil de ser quebrado.


Todos os nossos pensamentos, sentimentos, palavras, acções, estruturam impressões no subconsciente, como se fossem cicatrizes e dependendo se o samskara foi criado por uma experiência, que é interpretada como feliz, boa, positiva, ou pelo contrário uma que seja caracterizada como negativa, traumática, ou até dolorosa, afectar-nos-à de uma forma positiva ou negativa. Gregor Maehle escreve sobre o Sutra III, II.10, " If we are in a state of calmness for one hour, this in itself will set a tendency for the future. If we then get agitated, agressive, or depressed, this also will call for repetition due to the imprints it leaves. If we constantly put in place imprints of calmness, the mind will slowly let go of its agitation and dullness and become calm." (2)


O samskara é mais que um hábito, porque congrega uma componente emocional e energética que condiciona as nossas emoções, comportamentos e o estado da nossa mente. Quando repetidos vezes sem conta, virão um hábito, mas são mais profundos do que este, nalguns conseguimos perceber a razão que nos leva a agir, pensar ou sentir daquela forma, no entanto existem samskaras muito profundos, difíceis de compreender a sua causa.
O que fazer para quebrar o ciclo interminável dos samskaras negativos? Como superar os seus condicionamentos e elevar-nos a uma vida mais feliz e mais saudável?


(1) Feuerstein, Georg, Shambhala Encyclopedia of Yoga.
(2) Maehle, Gregor, Ashtanga Yoga Practice & Philosophy, New World Library, 2007.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Com ou sem crenças...


Dentro desta sala coexistem diferentes pessoas, com corpos, mentes e crenças diferentes. Lado a lado praticam, alguns trocam sorrisos no inicio da aula, outros mostram-se frios e focam o olhar em frente, como se não existisse ninguém ao seu lado, uns lançam um olhar de piedade e compaixão, quando outro geme de dor ou de esforço, outros comportam-se como se estivessem numa corrida, o primeiro a chegar ganha, mesmo quando não existe no Yoga nenhuma regra de concorrência ou competição, há ainda aqueles que se namoram entre uma postura e outra, há também os que são amigos de sempre e que lá vão trocando risos às escondidas do professor e até existem alunos que são parentes, irmãos, pais e filhos, avós e netos, que praticam sempre lado a lado e enaltecem o elo familiar... a descrição dos alunos poderia continuar, dentro de uma sala de aula encontra-se de tudo e tudo é o reflexo da personalidade de cada um. Como se comportam em cima do tapete é como se comportam na vida e a hora ou hora e meia de prática de Yoga, mais cedo ou mais tarde, irá mostrar como realmente são, apresentando até aqueles aspectos que nunca conheceram ou que nunca quiserem conhecer.


Uns dobram-se mais e outros são mais rijos, uns conversam consigo mesmo durante toda a prática, em pleno diálogo mental, quase que fazem a lista das compras ou repensam no que irão cozinhar para o jantar e pelo contrário encontramos os que se focam na respiração e geram tanto calor, que conseguimos ver gotas e gotas de suor a escorrerem-lhes pela cara, uns já acreditam nos benefícios da prática e outros ainda estão na fase de a testarem, uns anseiam por chegar há terceira série de posturas do Ashtanga Yoga mas outros, não têm expectativas quanto às posturas... as motivações são diferentes, porque as pessoas são diferentes.


Mas além de todos estes aspectos, há ainda dentro desta sala, cristãos, judeus, protestantes, etc. Ninguém sabe da crença religiosa um do outro, bem como da crença política, mas ali estão, lado a lado a praticarem Yoga, apesar das motivações, apesar da habilidade física e foco mental, ali estão a desenvolverem um pouco mais o conhecimento e consciência sobre o seu corpo, a sua mente e a sua alma. Não importa as diferenças, mas sim o que lhes é comum.


(Em plena aula de Mysore, fui escutando fora da sala, uns barulhinhos, cheguei perto da porta e reconheci uma das alunas que já tinha acabado a prática, estava sentada no sofá da entrada, de frente para as fotos do meu Guruji, Shi K. Pattabhi Jois e do meu professor Sharath Rangswamy, bem como para as estatuetas de Shiva, Ganesha e Hanuman. Continuei a dar aula e os sons continuavam lá fora, cheguei mais perto da porta e percebi que esta aluna, que não é portuguesa, estava a rezar baixinho, na língua dela, que não é o português. No final da aula, quando ela ia a sair, despedi-me e reparei em duas medalhas que trazia ao pescoço, uma identifiquei logo como Jesus Cristo, a outra pressumi que seria de um santo. Desliguei as luzes da sala e também me sentei no sofá da entrada e constatei que uma escola é mesmo isso, um lugar onde pessoas de diferentes crenças, católicos, hindus, ateus, etc se juntam, por algo que lhes é comum, que é a prática. E embora a prática de Yoga, seja oriunda da Índia, país maioritariamente hindu, não significa que tenha de ser praticada apenas por hindus, ou por indianos, todos podem e devem praticar e nem por isso têm de deixar de lado o que acreditam!)

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

"Nunca desistir"










Passando os olhos pelo seu caminho profissional e pelo rol de prémios que alcançou, rápido se percebe que o que lhe dita os passos não é só um sonho, mas a perseverança, dedicação e disciplina. Tem como lema "nunca desistir", premissa que a motivou a obter 15 anos de experiências, de campeonatos, de vitórias, de viagens e de conhecimentos adquiridos por acreditar no que faz. Catarina Sousa, é uma atleta reconhecida no bodyboard nacional e internacional e com certeza ficará na história deste desporto.


Quando é que começaste a praticar bodyboard e como foi o teu percurso até decidires que querias competir?
Comecei a praticar no 1º encontro feminino de Bodyboard em 1993, em Carcavelos promovido pela Dora Gomes. Já queria fazer bodyboard há imensos anos, mas não podia porque os meus pais achavam que era um desporto masculino e com muito mau ambiente. Comecei a competir 1 ano depois, pois já queria há muito tempo.
Tens sido uma atleta importantíssima para o bodyboard português, no teu currículum tens uma colecção de vitórias nacionais e internacionais, depois de tantos prémios alcançados, como te sentes como TOP 4 Mundial em 2010?
O facto de estar no topo das melhores do mundo e os títulos conseguidos são fruto do meu esforço e dedicação ao longo de 15 anos. Durante estes anos escolhi estudar Educação Física e Desporto para aprender a ser uma atleta, acabei por apenas sair de casa dos pais aos 30 anos para ter dinheiro para fazer o Circuito Mundial e onde ao 33 anos ainda aposto tudo naquilo que gosto de fazer.
Com esta soma de prémios, consegues distinguir um, que te foi particularmente memorável?
Sem dúvida que sim. O 1º foi quando consegui o titulo de Campeã da Europa em 1998, mas o mais marcante foi quando consegui ganhar uma etapa do Circuito Mundial em Sintra. Sempre foi o meu sonho desde que comecei a competir. Este campeonato existe desde 1994 e desde esse ano até aos dias de hoje nunca falhei nenhum. Mas só em 2009 consegui vencer finalmente em casa. Ainda hoje não tenho palavras para descrever o que sinto!
Mas uma campeã, não vive só de vitórias, como digeres as contrariedades da competição?
Ganhar só ganha 1 e raramente é sempre a mesma. Por isso é como em tudo na vida há que aprender a viver com as derrotas. Sempre olhei para uma derrota como uma vontade de treinar e me dedicar ainda mais.
Em que consiste a tua preparação para os campeonatos?
Hoje em dia os meus treinos passam por estar muitas horas na água, cerca de 2h/3h dia no Inverno e 4h/5h no Verão. O yoga passou também a fazer parte desse treino, assim como a meditação. No inicio da época faço sempre preparação física, passando pela corrida e exercícios localizados.
Que papel e que importância tem a prática de Ashtanga Yoga na tua vida e nas tuas competições?
Desde as primeiras sessões apercebi-me que o Yoga me auxiliou e auxilia muito na competição. O trabalho de força e flexibilidade, associado à respiração é muito útil e uso isso em competição e até mesmo no meu dia-a-dia. Tudo está na nossa mente e é preciso aprender a saber controlá-la.
Catarina já andas com a prancha de bodyboard debaixo de um braço e um tapete de Yoga debaixo do outro, ou a tua dedicação estará sempre incondicionalmente para o teu desporto, o bodyboard?
Sinceramente nunca sei o dia de amanhã.
A verdade é que o Bodyboard já faz parte da minha vida há 15 anos e tenho ainda mais projectos para que possa fazer parte durante muito mais tempo. O Yoga é cada vez mais importante não só para a competição, mas também para o meu bem estar físico e psíquico, possivelmente continuarei a praticar ambos por muitos mais anos.

Esta mulher de estatura pequena tem a alma de gigante, é campeã, atleta, treinadora, professora, uma verdadeira impulsionadora do bodyboard em Portugal, comprova que com dedicação e trabalho tudo se consegue. E que o sonho é apenas uma semente para o sucesso, que é necessário força de vontade, espírito de sacrifício e humildade.